segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Crítica: A Garota no Trem (The Girl on the Train, 2016)

Desde seu lançamento nas bancas, o best seller "A Garota no Trem" ganhou comparações com o elogiado "Garota Exemplar". Digamos que ambas as tramas acontecem no mesmo ambiente e possuem o mesmo público. Mas ainda que seja um excelente livro, estamos falando de dois produtos distintos e essa diferença se torna ainda maior quando assistimos suas adaptações na tela grande.

por Fernando Labanca

"A Garota no Trem" é mais uma obra que encontra fascínio nesta espécie de thriller doméstico, onde os mistérios são trabalhados dentro dos limites das casas do subúrbio e tem seus simples moradores como protagonistas. É uma dinâmica interessante e torna suas tramas mais próximas do público. Aqui, temos uma única história guiada por três mulheres, três olhares distintos que vão se somando e construindo, assim, um intrigante quebra-cabeça. Rachel (Emily Blunt) é uma mulher alcoólatra, que divorciada de seu marido, tenta seguir com sua vida miserável e sem novos propósitos. Diariamente, quando embarca no trem, avista de longe a casa que um dia foi sua, mas que agora é habitada por seu ex (Justin Theroux) e sua atual esposa, Anna (Rebecca Ferguson) . Bem perto dali, ela também consegue observar uma outra casa, onde vive um casal, aparentemente perfeito, Megan (Haley Bennett) e Scott (Luke Evans). Eis que certo dia, ao passar por ali, percebe que aquela mulher está traindo o marido. Se apegando as dores de alguém que ela nem sequer conhece, mas que de certa forma abre feridas antigas, Rachel decide, erroneamente, se aproximar dessa história e acaba se transformando na principal suspeita quando Megan, misteriosamente, desaparece.


Como adaptação, "A Garota no Trem" é um caso a ser analisado. O texto é completamente fiel aos das páginas, recuperando até mesmo diálogos. Não há muitas vírgulas fora de lugar e tudo acontece exatamente como acontece no livro. Por um lado isso é ótimo, logo que quase nunca um longa-metragem conquista esta proeza. Por outro lado, vemos aqui um roteiro seco, conciso e simples demais. Não há tempo para detalhes nem para dramas prolongados. É aquilo que nasceu para ser e ponto. Este não é um defeito exclusivo da obra e é algo que tem acontecido com frequência no cinema atual. Não há escapes e personagens seguem a risca aquilo que são propostos a fazer. Parece não haver um processo, um desenvolvimento mais convincente. Rachel é a mulher alcoólatra que precisa resolver um mistério. Megan é a vítima e Anna a esposa acomodada. E ponto. Ainda que exista sinais de complexidade em cada uma delas, o roteiro não se mostra interessado em mostrá-los com mais cuidado, mais zelo. É uma pena porque o grande poder desta história se encontra justamente na mente delas, na ambiguidade, nos confusos desejos, na culpa que todas sentem perante seus parceiros abusivos. Há muito o que ser discutido dentro da boa proposta e o filme erra em fazer do mistério seu único atrativo. Erra ao não cavar toda a profundidade que seus personagens tinham a oferecer. "A Garota no Trem" veio fiel ao produto original, mas em uma versão mastigada, de fácil digestão. 

Vale ressaltar que o longa tem a capacidade de manter o público preso a sua trama. E isso é bom. Pode parecer confuso na linha temporal que estabelece em seu início, mas tudo flui bem durante seus minutos. Todos os acontecimentos intrigam e o final não decepciona, oferecendo uma ótima conclusão, que poderá  surpreender alguns. Tate Taylor, diretor do ótimo "Histórias Cruzadas" (2011), outra famosa adaptação de um best seller, infelizmente prova não ter sido a melhor escolha para comandar o projeto. Com poucas ambições, o diretor parece simplificar o máximo que pode cada sequência. É então que compreendemos a grande diferença entre "Garota Exemplar". Aqui não temos um David Fincher. Taylor não tem assinatura tampouco habilidade de oferecer uma obra mais ousada. Não vai além daquilo que tem em mãos, daquilo que se espera. A trilha sonora de Danny Elfman reforça sua atmosfera de novelão, soando forçada grande parte do tempo. Outro grande problema vem do roteiro, que se perde ao nunca conseguir completar um raciocínio. A trama é um amontoado de lembranças e flash backs. E isso quebra sua força. Parece não haver uma continuidade, um pensamento que segue adiante, não flui quando a todo instante somos inseridos no passado. Quase nunca é o momento em si, mas um momento já vivido e recordado, que logo recebe um corte e nunca uma consequência. Dessa forma, várias cenas que poderiam render mais, são rapidamente finalizadas pois não passavam de um flash. São muitas quebras e pouca evolução. 

"A Garota no Trem", no entanto, tem a seu favor três grandes atrizes. Emily Blunt faz algo muito difícil aqui e poderia ter dado muito errado nas mãos de outra profissional. É um trabalho competente e muito seguro, transmitindo verdade além de toda a angústia e desespero vivido por sua Rachel. Rebecca Ferguson é uma recente revelação no cinema e prova, mais uma vez, não ser uma aposta errada. Megan é uma personagem cheia de muitas oscilações e mesmo que não fique muito tempo na tela, se destaca pela força de Haley Bennett como atriz. E digo que por elas, a sessão acaba valendo a pena. Apesar dos pecados, o longa tem a sua relevância no nosso momento atual, acaba que sutilmente trazendo boas discussões.Temos aqui, três protagonistas femininas, três vozes distintas que de alguma forma foram confrontadas pelo sexo oposto, seja no passado ou no presente, todas foram assediadas e tiveram suas vidas definidas por isso, pela insegurança, pelo medo, pelos fantasmas que as assombram e ainda pela pressão social de ser mãe, esposa, de ser mulher. O filme fala dessa culpa, desse peso que elas carregam por acreditarem que foram responsáveis por todos os danos que enfrentaram. Em uma sociedade que ainda acredita que a culpa é da vítima, o longa usa dessas três mulheres para dizer que não! E no meio de todo o mistério e suspense, de todo o entretenimento, encontramos duros relatos e boas intenções. 

NOTA: 7




País de origem: EUA
Duração: 112 minutos
Distribuidor: Universal Pictures
Diretor: Tate Taylor
Roteiro: Erin Cressida Wilson
Elenco: Emily Blunt, Rebecca Ferguson, Haley Bennett, Edgar Ramirez, Luke Evans, Justin Theroux, Allison Janney, Liza Kudrow, Laura Prepon




2 comentários:

  1. filme marrom,bem trabalhado, com boa direção e elenco mas uma história fraca que não se sustenta, muito previsível...

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  2. Não conheço a maioria dos atores do elenco mas o protagonista Luke Evans é um ator incrível. Adoro o estilo dele, além de inteligente para escolher os projetos no que trabalha, faz pouco tempo que a vi em professor marston e as wonder woman e acho que é extraordinária. é algo muito diferente aos que estávamos acostumados a ver. Um dos melhores filmes do ano passado.

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