quinta-feira, 25 de junho de 2015

Crítica: Divertida Mente (Inside Out, 2015)

Assim como muitos admiradores da sétima arte, sou um grande fã da Pixar e apaixonado por muitos filmes que o estúdio já realizou, no entanto, é notável a decadência que sofreram nos últimos anos, entregando projetos duvidosos como "Carros 2" (2011) e "Valente" (2012). Quase dois anos sem lançar algo nos cinemas, eles voltaram, renovados, colocando "Divertida Mente" não só na lista dos melhores que eles já produziram ao longo de sua história, como uma das melhores animações dos últimos tempos.

por Fernando Labanca

Antes de mais nada é preciso ressaltar: "Divertida Mente" é um filme para adultos. Talvez por suas cores e por seu visual deslumbrante, as crianças poderão se envolver ali no momento, mas não vejo a possibilidade delas aproveitarem a obra tanto quanto os mais crescidos. Há muito o que pensar, analisar e refletir na tela, nos entregam uma ideia complexa, desenvolvida com inteligência e maturidade. Os próprios adultos, por sua vez, assistirão a trama com os olhos atentos, é preciso ver os pequenos detalhes deste roteiro engenhoso para acompanhar o excelente raciocínio que a obra propõe. É uma daquelas experiências únicas, que sabe ser nonsense na medida certa e genial na maior parte do tempo. Atualmente, nos cinemas, são poucos os cineastas que conseguem criar uma viagem boa com esta, Terry Gilliam, Charlie Kaufman e Michel Gondry são alguns desses profissionais que nos levam para um novo universo, para desfrutar algo que a realidade jamais será capaz de oferecer. Pete Docter, um dos cabeças da Pixar, é mais um a alcançar este feito. Ele fez isso em "Monstros S.A" (2001) e volta a fazer aqui.

A premissa da obra é nos mostrar o que acontece dentro da mente de cada um, nos apresentando este universo comandado por emoções - a Alegria, a Tristeza, a Nojinho, o Medo e a Raiva -  que em uma sala de controle, são responsáveis por guiar os seres humanos, definindo como cada um deve reagir de acordo com as situações da vida, desenvolvendo, assim, a memória, a identidade e personalidade de cada pessoa. "Divertida Mente", nos apresenta a mente de Riley, uma menina de onze anos que passa por um momento complicado, mudou de casa ao lado da família e agora precisa lidar com as alterações em sua rotina, nova escola, novos amigos e novos receios. Dentro de sua mente, a Alegria é quem manda, entregando todo seu esforço para que Riley seja feliz a maior parte do tempo, entretanto, devido um incidente, ela e a Tristeza acabam sendo expelidas da Central de Controle, é então que partem em uma jornada para retornar e impedir que a menina reaja às novas experiências de forma negativa, voltando a ser alegre como era.


"Divertida Mente" possui uma ideia genial e a maneira como o roteiro trabalha todas as possibilidades é brilhante. É feito de várias camadas e a cada novo instante, uma nova descoberta, crescendo ao seu decorrer, trilhando sempre por caminhos surpreendentes e de extrema originalidade. A jornada da Alegria e da Tristeza, dentro da mente de Riley, é sensacional. É muito mágico descobrir este universo ao lado delas, passando pelo trem do pensamento, a produção de sonhos, a ilha da imaginação e por seu subconsciente, e todo aquele encontro surreal de tudo o que a personagem é feita, suas memórias, lembranças, e as ilhas criadas dentro de si e que definem sua personalidade. Faltam palavras para descrever a grandiosidade e genialidade de tudo isso. Como é incrível se deparar com aqueles seres estranhos que encenam seus sonhos, com o palhaço que a amedronta, ou com seu amigo imaginário renegado, entregando ainda momentos divertidos como a sequência "abstrata" ou como quando encontram a razão para a menina sempre relembrar um jingle viciante de um comercial da TV. Chegando ao comovente instante em que se deparam com o limbo do esquecimento, numa cena tão encantadora quanto dolorosa. 

Esta nova animação da Pixar, é um dos projetos mais inspirados do estúdio. Repleto de momentos poéticos, personagens bem delineados que causam empatia e interesse fácil, diálogos doces e um cenário encantador, que nos faz querer adentrar a tela e viver um pouco daquilo. “Divertida Mente” é, definitivamente, um filme completo, que traz uma aventura empolgante, sem jamais decair, uma história fantástica, cheia de boas sacadas e reflexões profundas. Carrega, ainda, em seu decorrer, uma boa dose de emoção. Desde “Toy Story 3”, uma animação não alcançava tal êxito, não de forma tão delicada e tão honesta. Vejo que a obra é sobre amadurecimento, desta transição da personagem saindo da infância e tendo que encarar alguns problemas e dilemas reais. É um pouco sobre esta dificuldade de crescer e aceitar que nem tudo é eterno. E o longa nos proporciona isso, criando uma atmosfera nostálgica, saudosista, nos fazendo voltar a ser criança e relembrar a dor de envelhecer. Inevitável não pensar na própria vida e nessas “ilhas” que perdemos ao longo do tempo, nos laços que rompemos sem planejamento e que nos tornam, não melhores, mas diferentes. É bastante inteligente e curiosa a forma como o roteiro nos apresenta tais ideias, sobre como essa transição reage dentro da mente, tudo o que destrói, o que se altera, o que se esquece. 

Em certo momento do filme, quando, adentramos na mente da mãe de Riley, percebemos que a tristeza tem papel fundamental em suas escolhas e em suas atitudes, bem diferente da filha, comandada pela alegria. A transformação e o amadurecimento da jovem acabam por revelar que alegria e tristeza coexistem, que precisamos de uma tanto quanto da outra, assim, como o receio é necessário para vencer, felicidade não pode ser felicidade sem antes compreendermos o que não é. Saí do cinema e a satisfação que sentia não cabia dentro de mim, como é bom ver algo deste nível, que vai muito além do que as últimas animações foram. Dentre tantos acertos, o filme ainda se destaca por seu belíssimo visual e por sua excelente trilha sonora, composta por Michael Giacchino, marcando mais uma parceria com o estúdio. Sem ser didático ou explicativo, “Divertida Mente” não deixa de ser um estudo complexo sobre a consciência humana, que nos faz pensar e refletir sobre tantas coisas. Uma ideia magnífica que dá vida a uma obra milagrosa, fascinante, memorável. A animação do ano (e dos últimos anos também), e sem dúvidas, um dos melhores filmes de 2015. 

NOTA: 10




País de origem: EUA
Duração: 94 minutos
Distribuidor: Disney / Buena Vista
Diretor: Pete Docter
Roteiro: Pete Docter, Meg LeFauve, Josh Cooley
Dublagem original: Amy Poehler, Phyllis Smith, Mindy Kaling, Bill Hader, Lewis Black
Dublagem nacional: Miá Mello, Katiuscia Canoro, Dani Calabresa, Otaviano Costa, Leo Jaime


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