sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Crítica: A Família Flynn (Being Flynn, 2012)

Em 2001 chegou aos cinemas uma incrível obra chamada “Um Grande Garoto”, comédia dramática bastante sensível e divertida que revelou o diretor Paul Weitz, que até então tinha apenas se aventurado no primeiro filme da saga “American Pie”, e ao longo desses anos ele realizou alguns trabalhos de qualidade duvidosa, outros, até interessantes mas pouco conhecidos. Eis que este ano me deparo com um filme que me recordou o porquê de eu admirar tanto o trabalho deste cara, surge tão bom quanto em seu início de carreira, “A Família Flynn”, drama com Paul Dano e Robert De Niro, que aqui no Brasil teve o azar de ser lançado diretamente nas locadoras, o que é uma grande pena, pois se trata de um filme poderoso, conflitante, surpreendentemente bom.

Por Fernando Labanca

Baseado no livro “Another Bullshit Night in Suck City” escrito por Nick Flynn, o filme acompanha o embate entre duas vozes, a de Jonathan Flynn (Robert de Niro) que narra sua incrível jornada sendo, segundo ele mesmo, um mestre em contar histórias, um dos nomes mais importantes da literatura norte-americana. Por outro lado, vemos sua própria história sendo contada por seu filho, Nick Flynn (Paul Dano) que perdeu a mãe por suicídio e que fora abandonado por ele, seu pai, que não o vê há dezoito anos. É então que Nick nos revela o verdadeiro Jonathan, passou pela prisão por ações ilegais, perdeu a casa e seu carro, no qual o usava para trabalhar como taxista, é um alcóolatra, um indigente, perdido no mundo. Até que Nick, que é um aspirante escritor, que tão transtornado pelos acontecimentos de sua vida, decide ajudar o próximo, trabalhando em um centro comunitário, que ajuda moradores de rua, é onde, depois de tantos anos, se reencontra com seu pai e se vê obrigado a resolver os problemas e conflitos que os levaram até ali.


“A Família Flynn”, certamente, beira a genialidade com seu mais que brilhante roteiro, também assinado por Paul Weitz, narrando a trajetória destes dois personagens, e que personagens! É muito incrível e muito sábio o uso da narração em off, permitindo que eles nos revelem quem são, o que sentem, mesmo que Jonathan seja incapaz de afirmar sua verdadeira condição, é onde entra Nick, que vê tudo, até mesmo o pai que nunca teve. É Nick quem dá vida a seu pai, que se não fosse por suas palavras, talvez ele nem mesmo existisse, ele dá um rosto ao nome, lhe entrega alma e uma chance de redenção. É simplesmente belo este embate entre pai e filho, seus conflitos, suas crises, o insistente dom que ambos tem em negar o que são, em aceitar suas fragilidades, o sofrimento de Nick em compreender seu mundo altamente abstrato, de uma mãe tão terna que o deixou, de um pai que lhe deu sua vocação, ser um escritor, mesmo que ele nunca tenha sido um, mesmo que a “obra-prima” que Jonathan dedicou sua vida inteira escrevendo nunca tenha realmente nascido. Jonathan, aliás, é um personagem fantástico, é triste vê-lo ao fundo do poço enquanto ele acredita ser um artista. A relação de ambos é conflituosa, tensa, digna de cenas marcantes que ficarão na memória, com direito a diálogos extremamente belos.

O grande acerto da obra foi na delicada construção dos personagens, Jonathan e Nick são tão humanos que chocam, há uma complexidade enorme em cena que faz da trama algo imprevisível, longe de ser facilmente entendida, há muito sentimento em jogo, o transformando em um filme extremamente tocante, belo, angustiante, sem deixar de ser carismático, gostoso de ver.  A grande ideia se torna ainda mais interessante, quando colocam estes personagens em um cenário tão fragilizado quanto eles, em constante degradação, jovens que se perdem nas drogas e homens que batalham por um simples abrigo, em ter onde dormir nas noites frias em que a história ocorre e são esses elementos que dão um toque ainda maior de realismo ao filme.

Claro que nada disso teria dado certo sem os dois atores selecionados. Paul Dano, que é tão jovem, mas que já realizou ótimos personagens e já esteve em grandes filmes, realiza, mais uma vez, uma grande interpretação, se entrega a Nick, lhe dá todo o sentimento e fúria que ele necessitava. Ao seu lado, Robert De Niro em seu melhor momento em anos, se muitos apontaram seu “bom retorno” com “O Lado Bom da Vida”, que lhe rendeu uma indicação ao Oscar, digo que não é nada comparado a grandeza do que ele realiza aqui, isto sim, uma grande atuação, fazendo jus a sua carreira. Paul Weitz dá a chance que De Niro precisava e ele aproveita ao máximo, faz de Jonathan Flynn um personagem único, memorável, o anti-herói que há tempos o cinema não nos presenteava. E ambos juntos nos revelam um jogo de cena interessante, um show de interpretação. No elenco, ainda vemos a sempre magnífica Julianne Moore e a competente Olivia Thirlby.


O roteiro é belíssimo e muito bem arquitetado por Paul Weitz que também capricha na direção, nos entregando cenas incríveis, com uma edição bem pensada e cortes que provam a grande genialidade da obra. Quanto a trilha sonora, o diretor retorna a parceria que tanto deu certo em “Um Grande Garoto”, com o músico Badly Drawn Boy, compondo canções que engrandecem as cenas e complementam a beleza deste grande filme. "Being Flynn" é sobre estes dois seres tentando quebrar uma barreira para se conectarem, se conectarem como um pai e filho, onde nas cartas que durante anos os manteve ligados, nas palavras, na literatura, na ficção que aprenderam a apreciar, encontraram um lugar seguro para se sentirem maiores do que realmente são, mais penetráveis, e o que vemos é, na verdade, o momento em que eles precisam enfim encarar a realidade, pisar no chão e sentir de vez este mundo que eles tanto evitaram, perceber que eles tem alguém com quem contar. Em suma, mais uma obra-prima que passa despercebida pelos cinemas brasileiros e vão direto ao esquecimento, longe do grande público, sorte daquele que o achar, pois é, definitivamente, um filme maravilhoso, que me deixou sem palavras ao seu final, por sua inteligência, pela delicadeza ao compor personagens tão humanos que são interpretados por dois atores incríveis, Paul Dano e Robert De Niro. Poderoso, impactante, realista, um dos filmes mais sensíveis que vi (e senti) este ano. 

NOTA: 9




País de origem: EUA
Duração: 102 minutos
Elenco: Paul Dano, Robert De Niro, Julianne Moore, Olivia Thirlby, Lili Taylor
Diretor: Paul Weitz
Roteiro: Paul Weitz


2 comentários:

  1. O filme é uma pérola, uma amarração em palavras. A mesma palavra que liberta, aprisiona na angústia de tentar se fazer representar...uma obra prima!

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  2. MUITO BOM, FIZ DIVIDIDO ENTRE OS DOIS PROTAGONISTAS,TENSO,ÓDIO, AMOR, AMRGURA, ENFIM FAMILIA

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